Análise da
qualidade da educação brasileira não pode mais ignorar esse público que hoje
está fora da sala de aula
Cada nova rodada de divulgação do Ideb suscita, naturalmente, debates sobre os resultados de redes públicas e privadas. É positivo que isso ocorra, mas é preciso também reconhecer que qualquer avaliação da aprendizagem tem suas limitações. No caso do Ideb, uma das principais é o fato de captar apenas o que se passa dentro da escola, por ser baseado em testes de matemática e português, combinados com estatísticas de aprovação. Num país em que parcela expressiva dos jovens abandona os estudos antes de completar o ensino médio, isso resulta num diagnóstico impreciso sobre a educação de toda a juventude.
O ensino fundamental sofre menos com a
limitação de não avaliar crianças fora da escola. Segundo dados da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE, 95% da faixa etária entre 6 e 14
anos estavam matriculados nesta etapa em 2023, percentual que sobe para 99,4%
se incluirmos também a população ainda retida na educação infantil. Fora da
escola, portanto, estão apenas 0,6%. O percentual registrado na mesma pesquisa
em 2005, primeiro ano do Ideb, não era muito diferente: 87% das crianças de 6 a
14 no ensino fundamental. Isso significa que não houve no período inclusão
maciça de crianças mais pobres ou grande pressão por expansão de vagas. Pelo
contrário, a diminuição nas taxas de fecundidade resultou até em menos demanda.
Essa pode ser uma das explicações para
o fato de os resultados do ensino fundamental, especialmente os do primeiro
ciclo, serem melhores do que os do médio, onde a dinâmica demográfica é bem
distinta. Na faixa etária de 15 a 17, entre 2005 e 2023, a proporção de jovens
matriculados no médio saltou de 45% para 75%. Isso significa que, felizmente,
mais jovens de baixa renda estão conseguindo alcançar esta etapa, demandando
mais investimento e adequação das escolas às suas necessidades, mas há ainda um
longo caminho a percorrer.
Nesse indicador de juventudes fora da
escola, é importante destacar que as desigualdades são mais acentuadas. No
Pará, que teve a maior evolução do Ideb no ensino médio nesta edição, apenas
61% dos jovens de 15 a 17 anos estão nesta etapa, de acordo com o IBGE. Em São
Paulo, onde os resultados da rede estadual foram frustrantes, a frequência é de
85%. O esforço para trazer os jovens para dentro da escola é, portanto, muito
maior no Pará.
Outro retrato da desigualdade foi
apresentado por Carlos Moreno Sampaio, diretor de Estatísticas Educacionais do
Inep, na coletiva de apresentação do Ideb, na semana passada. De cada 10 jovens
entre os 20% mais ricos, nove concluíram o ensino médio até os 19 anos de
idade. Entre os 20% mais pobres, são apenas cinco em cada dez. Ou seja, metade
fica pelo meio do caminho. Necessitamos urgentemente melhorar a aprendizagem
daqueles que já estão na escola, mas ainda falta muito também para garantir que
todos os jovens consigam concluir a educação básica. A análise da qualidade da
educação brasileira não pode mais ignorar esse público que hoje está fora da
sala de aula.
(Por Antonio Gois)
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