Câmara Federal |
Não só as
emendas Pix —instrumento sem transparência em que a verba cai direto na
conta das prefeituras e governos estaduais e cujo valor foi multiplicado por 12
desde 2020— definem o Congresso. O parlamentar de sucesso segue uma
receita.
Com auxílio da IA, um estudo do jornal O
Globo mostrou que os discursos em plenário encolheram 39% no século 21. Falas
longas e elaboradas não cabem na modernidade que exige cortes precisos para
divulgação nas redes sociais. Um Carlos Lacerda hoje, com sua oratória
eloquente e de português compreensível, seria visto como estranho no ninho.
Logo um colega de Rondônia iria chamá-lo num canto e dizer ao pé do ouvido: uma
peruca colorida faz muito mais efeito. Atualize-se, rapaz. Compre um celular e
o mantenha sempre ligado. Registre qualquer coisa, principalmente as mais
insignificantes.
A cartilha
de modos e maneiras determinou que em 2024 a Câmara adotasse um ritmo
acelerado, com o objetivo de aprovar o maior número de projetos. Pouco importa
que, ao chegar ao Senado, a casa revisora, haja rejeição. O negócio é causar
polêmica —não, polêmica é uma palavra antiga e gasta. O negócio é lacrar.
Esse açodamento não permite a discussão e o debate
aprofundado dos temas, os quais podem ou não interessar à sociedade, mas que no
fundo são mais importantes para eles próprios, os deputados, que se agrupam
para defender as bets, a bala, o boi, a Bíblia e o diabo a quatro.
Foi assim que surgiu, nos últimos dias de
Arthur Lira à frente da Câmara, uma proposta de 115 artigos, cuja medida
central é a criação de uma tal Associação Interfederativa para a Cooperação no
Enfrentamento ao Crime Organizado Transnacional. Nome mais enfeitado,
impossível.
No pacote estão a castração química para
pedófilos, a anistia para portadores de armas ilegais (alô, alô, milicianos!),
a liberação e a aquisição de armas para quem é investigado ou condenado (alô,
alô, traficantes!), a permissão a juízes de aplicar a pessoas inimputáveis
períodos de 20 anos de internação e um dispositivo que é o famigerado
excludente de ilicitude — só que disfarçado. A turma não trabalha: atrapalha.
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